segunda-feira, 2 de julho de 2012

A inconveniência lógica do juridiquês


Há algum tempo que venho pensando sobre o linguajar utilizado no poder judiciário. Afinal, qual o significado implícito daquela linguagem rebuscada, excessivamente formal?

Hoje resolvi escrever sobre isso, e em uma breve pesquisa pude encontrar diversas pessoas com este mesmo norte de pensamento, sendo que este gênero de expressão é chamado popularmente de Juridiquês.

Enfim, não vou ser hipócrita e dizer que não aderi termos de difícil compreensão em relação à linguagem popular , aderi sim, e a princípio, de muito bom grado, mas acredito que este tipo de coisa é natural, principalmente para um acadêmico de Direito.

Vejamos então, o seguinte trecho proferido em uma decisão: "À vista disso, e nos parecendo mais consentânea com a boa lógica jurídica, exsurge inarredável a inferência de que a defesa, para os fins daquela regra processual, merece ser entendida restritivamente, na dimensão exata do contexto argumentativo dirigido, de modo específico, ao rechaço do pedido, nela não se considerando irresignações do contestante, cuja eventual prosperidade não venha alterar a sorte da iniciativa processual objurgada.".

(?)

Às vezes nos deparamos com este tipo de decisão judicial ou manifestações do Ministério Público dotadas de termos que não são normalmente utilizados pela sociedade, que necessitam de uma leitura mais cautelosa, diria até dobrada, para o integral compreendimento. A este modo de utilização "pomposo" da língua portuguesa, alguns estagiários de direito revelam-se maravilhados, com a falsa ilusão da tamanha cultura/conhecimento do magistrado ou promotor na exposição de suas ideias.

Então eu penso, quem, na verdade, são os maiores interessados das decisões judiciais? Por um momento, tomemos como exemplo uma sentença condenatória de homicídio doloso, quem, neste caso, são os maiores interessados? A meu ver, é o acusado, que poderá ter seu direto de liberdade rompido por anos, os familiares da vítima, que aguardam pela imprescindível "justiça", e a sociedade em geral, no anseio de não viver ao lado de um criminoso.

Consequentemente pergunto: A utilização de termos complexos é compreendida por todos os magistrados, promotores e tribunais do respectivo estado? Resposta: Provavelmente sim, pois em tese, são os maiores utilizadores.

É compreendido por eventual vítima, apenado e pela sociedade em geral? (Maiores interessados) - De forma hilária, provavelmente não!

Gostaria de frisar que não se trata de preguiça para estudo da norma e busca por um vocabulário rebuscado, inclusive acho que estudantes do direito possuem certo dever inerente a isto, e estar sempre preparado para este tipo de situação é imprescindível.

Penso ainda, que a linguagem rebuscada não deve se perder totalmente do cotidiano brasileiro, deve sim existir, como um estímulo à sua utilização moderada, mas não em excesso, como uma demonstração de poder e conhecimento incompreensível pela maioria, tendo como ideal mostrar a diferenciação de algumas classes privilegiadas.

A evolução de uma norma/língua tem que ser gradativa, e a língua portuguesa já é complicada com o que sabemos, ou não sabemos! É evidente que a sociedade brasileira não está preparada para tanto.

Finalizo com um trecho da dissertação realizada pela Ministra do STF, Fátima Nancy Andrighi, para a campanha nacional de simplificação da linguagem jurídica: “o cidadão deseja entender, de forma clara, o significado das decisões judiciais que possam interferir em sua vida. Não basta que se dê ampla divulgação aos julgamentos, é necessário que o juiz torne compreensível o conteúdo do que foi decidido”.

2 comentários:

  1. Olá Boa noite! Concordo plenamente, sou estudante de Letras, e muitas vezes me deparo com palavras tão rebuscadas quanto estas, e a bem da verdade, como aprendi no meu curso, a função importante da lingua é a comunicação e se o receptor não entende o interlocutor, o que adianta? Falar de maneira culta é necessário, mas há de se pensar no essencial, se fazer entender. Gostei muito do seu texto, e do blog em geral.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Olá Tami Macedo, é isso mesmo. É bom saber que compartilham do meu pensamento em outras áreas de aprendizado, principalmente sendo estudiosa da língua portuguesa. Como você bem frisou, "se fazer entender" é o essencial.

      Muito obrigado pelo comentário, gostei bastante do seu blog também!

      Excluir

Total de visualizações de página

Seguidores